quinta-feira, junho 29, 2006

Os sonhos

Os sonhos...
são pequenas aves,
pássaros sem casa...
são mistérios próprios de quem espera
e inventa os mundos, outros,
que hão-de ser...

em dias de passagem
de esperança
ou desespero.

Os sonhos,
abominam as gaiolas
e perdem-se no mundo...
soltos,
desdenhando dos seus donos.

São aves famintas,
pequenos pardais perdidos
na loucura dos céus sem fim.

E nós somos como eles...
à procura de quem sonhe...

Lisboa, 29-06-2006

quinta-feira, junho 22, 2006

Quando me olhas

Quando me olhas e dizes: não te quero!
Rasga-se o peito que acolheu a dor
Das mágoas que trazias em pendor
Oferecidas por quem te foi severo.

Dizes-me: Não te amo, não te espero!
Agitam-se meus olhos em langor
E sentem que afinal não foi amor
O amor que me juraste são e vero.

Dizes que não te quero nem desejo,
Nem quis ou desejei um dia atrás.
Se fui, na tempestade, teu abrigo

Agora não vislumbro tal ensejo!
Dizes que eu sou a guerra e tu a paz;
Que foste amiga e eu um vil amigo!

joão lopes

segunda-feira, junho 19, 2006

Feres-me

A tua boca fere-me de morte
Quando me beija com palavras vãs
Inundando minha alma em fraca sorte,
Num ódio cego: secas e vilãs!

São escolhidas, altivas e com porte
Qual nevoeiro cerrado nas manhãs
Impedindo o navio olhar o norte,
agitando o mar cego dos afãs

Que se soltam dos olhos quando sentem
Os ventos que se agitam em tempestade
Terminando a viagem em alto mar.

As palavras que dizes não me mentem
Pedindo que eu não seja mais verdade
Nem farol que segure o teu olhar.

joão lopes

sexta-feira, junho 16, 2006

a nossa casa

O mundo é a casa que fazemos...
e os sonhos que pensamos.
É as voltas e as revoltas do que queremos...
no mistério fundo das certezas e enganos.

Este mundo imenso e tão cruel
onde sós e tristes procuramos companhia
e por isso angústia e mel
no desejo e na vertigem d' alegria.

Assim somos nós...
ocupante provisórios, almas forasteiras
animais cativos em frágeis ratoeiras.

Bombas relógio à espera do momento...
a hora exacta do regresso às águas
em que deixamos a casa p'ra outras mágoas...

Porto, 16 de Junho de 2006

quinta-feira, junho 08, 2006

Mil desejos

Mil desejos, mil sonhos, mil tormentos;
Mil tudos... E, no mesmo ser, mil nadas;
Mil promessas de amor e sentimentos,
P’lo mesmo ser, as mil, atraiçoadas.

Mil sonhos atirados por mil ventos,
Mil achas, p’lo mesmo gume, esfaqueadas;
Sorrisos mil e os mesmos sofrimentos,
Depois das mil palavras esfarrapadas!

Mil sonhos, mil tormentos, mil desejos
E a solidão tão vasta e infinita
nos mil sonhos onde me invento e crio.

Mil ternuras criaram os mil beijos
E, os mil tormentos, essa voz bonita
Que em mil vezes me deu tudo — e o vazio!

joão lopes em 1988

domingo, junho 04, 2006

Traguei pó

Traguei pó, caminhei intensamente
Sobre espinhos e pedras pontiagudas;
Se me falaram, fiz orelhas surdas,
De tudo em meu redor eu estive ausente.

E segui, caminhei, fui sempre em frente.
Seguindo, procurei tuas ajudas,
Mas, as tuas palavras eram mudas
E eu sofri pela surdez de antigamente!

Só a ti via, só a ti ouvia!
Somente agora compreendi que errei,
Por não ter escutado o bom conselho!

Sou uma amálgama melancolia!
As chagas abriram e, eu não parei...
...Irei até morrer, podre de velho!

joão lopes em 1988