terça-feira, novembro 07, 2006

Se eu pudesse ao menos

Se eu pudesse ao menos
aprisionar o tempo...
no breve instante
em que as tuas asas, novas, novas,
se abrissem para o céu...

Sobre as asas tu dirás
que não as vê quem ama
na cegueira da paixão...
pois que o digas!

Se apenas um momento,
um momento breve...
e nele,
de súbito saísses
no teu voo inaugural...
enquanto eu ficasse assim,
na prisão da espera.

Como se acaso
tu voltasses algum dia
ao preciso instante em que saíste...

Se eu pudesse ao menos
durante a tua gaia fantasia
guardar os cheiros e as cores da manhã
e os primeiros risos de alegria...

Se eu pudesse ao menos
estancar o sangue
que é a vida!...

E se pudesse...
sei que pedirias
num momento... um dia...
que abrisse a força dos meus dedos...
e então...
em suprema agonia
soprasse em ti a liberdade...

Que acreditasse em ti
e de manhã... bem cedo,
à hora que os pássaros cantam
e a luz invade o dia
eu te visse voar enfim... sem medo!

Pudessemos nós...
ao menos
gerar a vida pela vida...


Porto, 7 de Novembro de 2006, enquanto a filha cresce...

sexta-feira, novembro 03, 2006

e agora já nem vento

E agora já nem vento...
só por sobre os rostos águia.

Ser olhos de rapina
e ténue fogo
por entre os brancos ombros
da montanha.

Um pássaro de sombra
contra o vento,
ou pedra sob o sol
e água breve.

Eu sou um pouco
deste pensamento.
Um pouco deste riso
de esquecer.

Eu sou águia,
o tempo de voar...
mas perdi o tempo
de ser mar!


Porto, 3-7-1980