quarta-feira, abril 26, 2006

As lembranças que nunca vivas...

Como fazer-te ver a força dessa luz
A ti, que nunca viste a bruma e as negras sombras?!
Como descrever-te o fio que conduz
A certa madrugada... cor da esperança?!

Peço-te por tudo que não esqueças
As lembranças que espero nunca tenhas.
Sobretudo, peço-te: mereças
A liberdade toda que o teu olhar agora alcança.

Hoje jantas à mesa dos teus sonhos
Porque tê-los é doce e já possível.
Mas não esqueças que é tão frágil este vidro...

Que este cravo que te ofereço, rubro...
Sendo hoje certo e apetecível
Porque fácil, tão presente... corre perigo.

para a Joana, 25 de Abril de 2006

terça-feira, abril 25, 2006

Os olhos de quem ama


Os olhos de quem ama são macios
E as palavras que dizem jamais cruas;
As mãos suaves, deixam entre os rios
De carinhos esvair doçuras tuas.

Os braços de quem ama não são frios,
São quentes: sóis de dia, à noite luas,
Aquecem-me nos mistérios vadios
Quando me enlaçam nas carícias nuas

Da pele que me excita o desejo forte
De te ter minha, ao menos uma vez,
Em gemidos sofridos de prazer.

Seguindo o teu hálito busco o norte
Onde escondes o amor que um dia fez
De ti – e em meus braços - uma mulher!


joão lopes

quinta-feira, abril 20, 2006

Noite e sonhos

A noite caiu já!... Suavemente
O negro manto arrastou-se e desceu,
O silêncio prantou-se, tristemente
Um coração magoado adormeceu!

Das brumas do amor, de longe se ergueu
O sonho que alimenta eternamente,
Vagueou p’la noite escura como breu
E uma alma envolveu tão docemente

E o sonho saciou, deu alimento
Arrastando os delírios de um amor,
Que em nada à alma trouxe maus assombros!

Fez-se luz e partiu do pensamento;
O dia foi trazendo o dissabor
Que o sonho deixa ao transformar-se em escombros.

joão lopes em 1989

sexta-feira, abril 14, 2006

Santa Páscoa

Trouxeste em Ti um pedaço dos Céus!
Trazias na voz o perdão para dar;
Num rosto d’Homem o rosto de Deus;
No olhar suave, uma fome de Amar.

Sandálias com pó nos pés que são Teus
E as mãos abertas para oferecer
Até, se preciso, os Teus simples véus,
Vestindo um corpo feito p’ra morrer,

E um coração bom p’ra ser trespassado.
Tu foste a dádiva do Pai p’ra nós,
Tu foste o Amor feito um raio de Luz!

Porque amavas tanto, f’riram Teu lado;
Por falares demais, calaram-Te a voz;
Por incomodares, pregaram-Te à Cruz!

joão lopes em 1989

sábado, abril 08, 2006

Como um barco

Como um barco assim cheguei
na calma ondulação das tardes
e a ti eu aportei...

E lento eu desfiz
a armação das velas e te amei
enquanto o sol brilhava...

E nas gotas que ficaram
nas curvas do teu corpo
dos suores de nós...

Reentrei firme e fundo
e nessas águas inventamos
o caminho para casa...

domingo, abril 02, 2006

De onde vem a amargura

De onde vem a amargura que devassa
O adocicado palato do alento
Que sinto esvair-se e sai, pela vidraça,
Dos frios olhos, na chuva do tempo

Que a vida é? O cansaço perpassa
Pela janela clara do violento
Rosto que é o meu, jazendo sem graça
Ao sol, à chuva, às agruras do vento:

Gelado e forte, faz dobrar os sinos;
Clamam, alto, pelo nome de quem ama
O leito agreste e frio onde se acalma

A dureza implacável dos meus hinos;
Porque arde o fel na boca e amarga a chama
Que trago em remoinho na minh’ alma?

joão lopes